Sonhos, inconsciente e transcendência
- 14 de fev.
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Atualizado: 1 de mai.
Os sonhos têm muito a dizer, quando analisados corretamente. Uma das mais poderosas manifestações do inconsciente está no universo onírico e isso não se limita apenas as manifestações de desejos reprimidos, como na ótica da Psicanálise, transcende na expressão simbólica da psique e faz parte dos mecanismos no processo de individuação.
PSICOLOGIA
O inconsciente pessoal armazena memórias, experiências, repressões, o inconsciente coletivo reúne os arquétipos presentes na humanidade. Dito isso, o sonho é um caminho qual o inconsciente comunica com ego para promover a reorganização psíquica, podendo fazer uma função compensatória e interativa dos conteúdos em seus aspectos não reconhecidos.
"O sonho é uma pequena porta oculta no santuário mais profundo e íntimo da alma" (Jung, 1934/2008, p. 51).
Se tratando de mundo onírico, isso é, o mundo dos sonhos, os simbolismos presentes não tem um significado definido, engessado, pré-determinado, na verdade eles variam de acordo com a experiência individual e cultural de cada sujeito; dessa forma os arquétipos mais presentes nas pessoas são conteúdos da sombra (aspectos reprimidos e desconhecidos), persona (máscara social), self (a totalidade psíquica), anima e animus (representação do feminino para o homem / representação do masculino para a mulher). Como o próprio Jung afirma, "os sonhos são, por assim dizer, a expressão não censurada do inconsciente, e eles frequentemente refletem com uma franqueza brutal o verdadeiro estado da psique" (Jung, 1948/2013, p. 103), ou seja, o sonho tem fluidez além dos padrões criados de contenção de sentimentos, desejos, etc.
Uma recomendação feita comumente dentro da clínica é a promoção de um caderno dos sonhos, não importa se o indivíduo lembrará integralmente o que sonhou ou apenas fragmentos, o importante é que o sonho seja anotado com riqueza de detalhes do que estiver vívido na memória como cores, pessoas, números, objetos, sensações, sons, cheiros, lugares e assim por diante. Através desse caderno é possível interpretar as dinâmicas mentais, identificar conflitos e traumas, integrar aspectos sombrios, desenvolver autenticidade, obter respostas mais objetivas para questões vigentes, dentre outros.
"A interpretação de um sonho enriquece a consciência do sonhador se for bem-sucedida" (Jung, 1958/2011, p. 164).
Jung teve um sonho no qual explorava uma casa desconhecida, a jornada começava no andar superior que era bem mobiliado, conforme alcançava novos andares o ambiente se transformava, ao descer encontrou andares rústicos e com aspectos antigos, até alcançar uma caverna pré-histórica. Esse sonho foi importante na formulação teórica da psicologia analítica, ele analisou como uma metáfora estrutural da psique, "o andar superior representava a consciência, os andares intermediários correspondiam ao inconsciente pessoal e as profundezas pré-históricas revelavam o inconsciente coletivo” (JUNG, 1963/2017, p. 212).
CIÊNCIA DOS SONHOS LÚCIDOS
A evolução científica e o desenvolvimento no campo de pesquisas metodológicas expandiu o entendimento sobre os sonhos, dando compreensão aos sonhos lúcidos, aqueles sonhos onde o sujeito sabe que está acordado e consegue controlar totalmente todo o sonho, essas pessoas são chamadas onironautas: viajantes dos sonhos.
Os sonhos possuem etapas e neurotransmissores que se comunicam fisio, bio e psicologicamente: fenômeno neurobiológico, estruturado pelos ciclos do sono e sonho que duram aproximadamente noventa minutos e se repetem diversas vezes por noite e abrigam quatro estágios fundamentais, sendo eles:
1) NREM (Non-Rapid Eye Movement):
N1 = sono leve, transição entre vigília e sono. Dura entre um e cinco minutos, quando ocorre a diminuição da frequência cardíaca e da atividade muscular;
N2 (Sono intermediário) = 50% do sono total, aqui ocorre o fuso do sono que é a rajada de atividade rápida e o complexo K que é o pico de alta amplitude. Dura entre dez a vinte e cinco minutos;
N3 (SWS - Sono profundo de ondas lentaa) = recuperação da memória, podem ocorrer sonhos menos vívidos.
2) Sono REM (Rapid Eye Movement): acontece noventa minutos posteriores ao início do sono, produz movimentos oculares rápidos, atividade cerebral semelhante ao da vigília, paralisia muscular. Aqui estão os sonhos mais profundos e complexos, dotados de cargas emocionais. O REM aumenta ao longo da noite e pode alcançar quarenta minutos no fim do ciclo.
Durante o sonho a atividade cerebral passa por alterações, durante o REM o córtex visual associativo produz os cenários e as imagens dos sonhos, o sistema límbico regula as memórias e emoções para influenciar as narrativas oníricas, o tálamo processa as informações sensoriais e ativa percepções internas. Enquanto o córtex pré-frontal dorsolateral, que é responsável pelo raciocínio lógico fica menos ativo.
Os neurotransmissores executam papel importante, a dopamina se relaciona a emoção e criatividade nos sonhos, a acetilcolina fica altamente ativa, facilitando a transmissão de impulsos entre neurônios. Tratando-se de hormônios, o GH é liberado no sono profundo para recuperação celular, a melatonina controla o sono de vigília e o cortisol é liberado no fim do ciclo preparando o corpo para acordar.
Keith Hearne, um psicofisiologista, conduziu uma pesquisa na Universidade de Hull, em 1975, para comprovar cientificamente a existência dos sonhos luc, sendo o pioneiro dessa investigação. O método contou com Alan Worsley, um experiente onironauta, que recebeu instruções para enviar sinais conscientes ao mundo externo enquanto estivesse dormindo, para isso foi levado para um laboratório do sono e conectado a um EEG (eletroencefalograma) para monitorar a atividade cerebral e ao EOG (eletrooculograma) para mensurar os movimentos oculares. Alan foi instruído a mover os olhos de forma especificamente padronizada para sinalizar que estava lúcido no seu sonho, o que ele fez durante a fase REM demonstrando a consciência e o controle onírico.
“A prova definitiva de que os sonhos lúcidos eram reais surgiu quando conseguimos registrar padrões de comunicação ocular pré-planejados, diretamente de dentro de um sonho" (HEARNE, 1978).
Com treinos e técnicas é possível aprimorar a qualidade dos sonhos e os controlar. Thomas, Jared and Dylan, em Sonhos Lúcidos, falam de algumas técnicas:
• Observar relógios nos sonhos: geralmente relógio de pulso, o porteiro anda para trás (acredite, é real).
• MILD (Mnemonic Induction of Lucid Dreams): repetir antes de dormir: "Na próxima vez que eu sonhar, saberei que estou sonhando".
• WILD (Wake Induced Lucid Dreaming: permanecer consciente enquanto o corpo adormece.
• FILD (Finger Induced Lucid Dreaming): movimentar levemente os dedos ao adormecer.
• WBTB (Wake Back to Bed): acordar após quatro horas de sonos, permanecer acordado durante vinte minutos e voltar a dormir para retornar a um sonho.



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